Castrados os ventos da esperança

Se o nosso país tem uma acentuada falta de um rasgo idealista, de ideologia de tradição humanista, como agora mais se evidencia, e de uma lúcida utopia que seja fator de regeneração da sociedade, é preciso dar asas à imaginação, debater o futuro, sairmos da nossa atávica mansidão (“pieguice”, como diria o “nosso primeiro”), convocar os sonhadores e os pragmáticos (finalmente) para um debate sério e a sério, de uma vez por todas, para alargado e descomprometido debate de ideias, à prova dos coletes de forças. Cada vez mais é preciso que haja valorização e prestígio político e que a política seja uma ciência com credibilidade, para que a vida em comunidade seja usufruída na base de princípios sólidos, permitindo uma consciência crítica construtiva e de respeito pela dignidade humana e pelas diferenças de opiniões, a que cada um tem direito. Somos adeptos incondicionais de que os “governantes” deviam prestar mais atenção aos pobres, aos excluídos, aos desempregados, aos reformados, aos mais jovens e aos mais frágeis, em geral. Governar tem de ser serviço a prestar ao bem comum e não uma questão de carreirismo, de ansiedade de “agarrar o pote” a qualquer preço. Ninguém pode gostar de se ver, de um momento para o outro, transformado num mero número de contribuinte ou num frio dado estatístico, muito menos que nos tirem a pele quando ainda tentamos respirar. Há. Tem de haver mais vida para lá do défice. No meio de tanto desencanto, de tanta ameaça de austeridade, para alguns, nesta hora de angústia apertada à ponta do silêncio, em que uns têm quase tudo e outros são obrigados a viver com quase nada, há que ter em conta a necessidade urgente de evitar que as sociedades percam a sua alma e entrem em conflito consigo próprias, meio caminho andado para o erguer da “forquilha” de qualquer “Maria da Fonte”. Não oferece dúvida que sem uma luz de esperança, sem nenhum pensamento orientador ou itinerário educativo, Portugal não encontra a paz nem a alegria de viver e de produzir. Ainda bem que há pessoas competentes que vão alertando para a humanização das políticas económicas para se abrandar a desmesura da austeridade inconsequente. Digamos que, do nosso lado, de todos os espezinhados de sempre se levantam titulados com o Nobel da Economia; e, cúmulo dos cúmulos, para que se pense, até o ministro da Economia da Alemanha aconselha ponderação a Portugal, reconhecendo o inconveniente de medidas tão agressivas que levam, cada vez mais, a um afundamento geral. A paralização de tudo, pela asfixia económica, não conduz à solução seja do que for. Uma economia de sentido ideológico, que não esteja subordinada a uma ética e a uma moral é sempre uma economia desumana e desajustada da realidade. Pela política e pelos políticos que temos, estamos condenados a debater pouco a Europa que queremos e precisamos para o futuro, a aprofundar os horizontes dessa pretendida reflexão, num mundo em constante mudança, sem o que nos pode conduzir a uma certa ausência de patriotismo. O velho continente – a Europa – precisa de conservar a verdadeira liberdade que a iluminou de esperança e que lhe deu qualidade de vida e respeito por si própria, sob pena de nos afundarmos numa crise de valores. Abram-se os olhos para ver, fechem-se para refletir. Sem o fôlego da esperança não há resposta para os problemas de Portugal.